Com mais de uma década de carreira, iniciada no Horizonte Njinga Mbande em 2009, a actriz revela como a arte se tornou o seu chamado, a sua forma de dar voz às histórias e de afirmar a mulher angolana no palco, na televisão e no cinema. Na novela Os Kambas, Sandra Maria vive a personagem Lukeny, uma mulher de coragem disfarçada de silêncio.
POC NOTÍCIAS | ENTREVISTA | geral@pocnoticias.ao | Foto: DR
Como se deu o início da sua trajectória artística?
A minha trajectória como actriz nasceu de um impulso interior, de uma necessidade de dar voz a histórias que me habitavam antes mesmo de eu saber contá-las. Comecei ainda criança, movida pelo fascínio pelo palco e pela vontade de transformar emoção em palavras, gestos e olhares. Descobri que a arte não era apenas um sonho, mas um chamado. Contudo, foi no Horizonte Njinga Mbande, em 2009, que tudo começou de forma profissional e estruturada, com a minha formação.
Há quanto tempo actua como actriz e como esse percurso tem moldado a sua visão sobre o papel da mulher nas artes?
Actuo há 12 anos, e cada experiência molda-me como o rio molda as pedras. Aprendi que a mulher nas artes não deve apenas ocupar espaço; deve criar espaço, abrir portas e iluminar caminhos. O palco ensina-me que ser mulher na arte é também ser ponte entre o que fomos e o que ainda podemos ser.
Como é fazer parte de um elenco que reúne diferentes gerações de mulheres?
É como sentar-me à mesa com irmãs, mãe, avós e filhas ao mesmo tempo. Ouvimos memórias, partilhamos sonhos e criamos algo que transcende o tempo. Cada geração traz a sua chama, e juntas formamos uma fogueira que aquece e inspira o público.
Interpretar uma personagem dentro de uma trama que aborda a poligamia exige sensibilidade. Como vivencia esse desafio artístico e emocional?
Eu mergulho primeiro na alma da personagem, antes de julgar as suas escolhas. Procuro compreender as dores, os silêncios e as esperanças que ela carrega. É um exercício de empatia profunda, porque a arte exige que eu veja com os olhos do outro sem perder o meu próprio coração e, muito menos, julgar.
Conte-nos sobre a sua personagem. Quem ela é, o que representa e como a conecta à realidade das mulheres angolanas de hoje?
A minha personagem, Lukeny, é uma mulher de coragem disfarçada de silêncio. Representa aquelas que, mesmo em meio a dilemas conjugais, mantêm a dignidade e o amor-próprio. Vejo nela muitas mulheres angolanas: resilientes, fortes e, ainda assim, ternas. Conecto-me a ela lembrando que cada mulher carrega uma história que merece ser ouvida com respeito.
Fora das telas, como olha para a poligamia tendo em conta a valorização da condição feminina numa relação conjugal?
Antes de mais nada, não concordo, mas respeito a opção de cada um. Acredito que qualquer relação, seja qual for a sua forma, só tem valor se respeitar a essência da mulher como ser humano completo. A condição feminina não pode ser reduzida a um papel secundário. A mulher precisa de ser vista, escutada e honrada sempre.
Na sua percepção, quais avanços têm ocorrido no cinema e na televisão angolana quanto à inclusão e representatividade feminina?
Vejo portas que antes estavam fechadas a abrirem-se a muitas vozes femininas. Hoje, não somos apenas personagens decorativas; somos criadoras, realizadoras, argumentistas. Ainda há muito caminho a percorrer, mas cada passo é uma vitória, e cada rosto feminino no ecrã é um reflexo de mudança.
Sente que esta produção representa bem a nossa cultura e capta a essência das mulheres angolanas?
Sim, porque mostra a mulher angolana como ela é: complexa, vibrante, forte e cheia de nuances. Não somos apenas coadjuvantes da nossa própria história, e esta produção recorda ao País — e ao mundo — essa realidade.
Como olha para a evolução do nosso panorama audiovisual?
Vejo um terreno fértil, onde as sementes da nossa criatividade estão finalmente a florescer. O audiovisual angolano está a aprender a contar as nossas histórias com autenticidade e qualidade. É um tempo bonito para acreditar, investir e sonhar mais alto.
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