Bandeiras coloridas drapejavam ao sabor do vento no largo da Independência onde, há 45 anos, num misto de nervosismo, esperança e entusiasmo, foram enterrados os 5 cincos séculos de colonização portuguesa para dar lugar ao nascimento do novo país, que se pretendia livre das amarras da repressão e exploração do homem pelo homem.
Em véspera da data que deveria ser a maior festa nacional, o tom colorido das bandeiras não escondia a tristeza do local onde os espelhos de água e os semáforos há muito deixaram de funcionar. Havia uma sensação de ar pesado a preencher os espaços vazios e os rostos dos transeuntes.
De punho erguido e olhar virado para sul, o busto do proclamador da independência nacional faz-me recuar no tempo e no espaço, remetendo-me para aquela noite de esperanças e promessas mil, de que tudo seria diferente naquele casamento que parecia perfeito entre o povo e os seus «libertadores».
Ao fim da tarde desta terça-feira, a praça da Independência estava vazia, aparentemente calma, mas o nervosismo indisfarçável.
Discreta e estrategicamente plantados no local e nos arredores homens de rosto fechado, que pareciam ter os olhos colocados aos ouvidos; de olhares discretos e ouvidos apurados que davam a sensação de filtrar os sons, entre o roncar dos veículos, em meio a um trânsito caótico.
Na praça, onde o povo alimentou há quase meio século as esperanças do amanhã diferente, do diálogo permanente entre os futuros governados e governantes era, ao cair da tarde um lugar lúgubre, tristonho, que vivia a medo.
De repente, vêem-me à memória imagens da nova Angola, do povo em debandada, da polícia de choque a carregar sobre os manifestantes, o ladrar de cães, o relinchar de cavalos, gritarias, gemidos, o esgar de bocas abertas a clamar pela liberdade, por empregos, por eleições locais, vozes prontamente caladas à força dos porretes de policiais másculos.
Faço um esforço para arredar as imagens de violência que me povoavam a mente, mas esta não obedece, pelo contrário traz-me à memória imagens da longa noite colonial, de agentes da PSP (Polícia de Segurança Pública) a investir a sua fúria sobre os negros dos musseques que pediam liberdade, justiça social e tratamento humano.
Por: Ilídio Manuel