Em entrevista ao POC Notícias, o economista Domingos Tchissasso, defendeu que a relação entre Angola e os Estados Unidos tem sido tradicionalmente mais fria e limitada. “Embora alguns negócios tenham sido realizados ao longo dos anos, a verdadeira força da parceria nunca foi completamente explorada, ao contrário do que se vê com a China, que tem se mostrado um parceiro comercial muito mais activo e influente”, considerou o economista.
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Para o analista, desde que Angola firmou acordos com a China, a presença e o impacto chinês têm sido muito mais visíveis, com investimentos em infra-estrutura, em particular no sector energético e de transporte, que transformaram a paisagem do país.
“A chegada de Biden, portanto, é um marco simbólico que pode, de facto, trazer novas oportunidades económicas para Angola. No entanto, a visita chega em um momento tardio. A questão é: o que pode ser concretizado, dado que Biden se encontra no final do seu mandato? Tem o Biden capacidade de tomar decisões administrativas e comprometer o novo governo dos EUA?”, questiona o economista, que, por outro lado, levanta dúvidas sobre o quanto essa visita poderá gerar resultados concretos para Angola, referindo que os acordos e decisões só podem ser plenamente implementados por um novo governo dos Estados Unidos, que poderá ter uma abordagem completamente diferente.
O Corredor do Lobito: Uma Agenda com foco no Interesse americano
Questionado sobre o interesse dos americanos no corredor do Lobito, o economista refere que “Esse corredor tem um enorme potencial de desenvolvimento para o país, ligando o interior de Angola ao Atlântico e tornando-se uma via crucial para o comércio regional. No entanto, o temor de que a visita seja mais vantajosa para os Estados Unidos do que para Angola é legítimo. A exploração de infra-estrutura estratégica por parte de investidores estrangeiros pode gerar vantagens económicas para Angola, mas também pode implicar condições desvantajosas para o país se os acordos não forem bem equilibrados”.
Domingos Tchissasso alerta que, Angola, embora sedenta por investimentos, precisa garantir que qualquer cooperação com os EUA seja feita em termos de “igual para igual”. “O receio de que o país se torne mais uma vez um mero fornecedor de recursos e matéria-prima, enquanto os EUA se beneficiam da exploração das infra-estruturas angolanas, é algo que o governo deve considerar seriamente. A equidade nas negociações e o verdadeiro benefício para o povo angolano são fundamentais para evitar que, no futuro, o país se veja novamente em desvantagem”.
No capítulo estratégico, o economista considera que “a questão crucial, neste momento, é a estratégia do governo angolano para gerir essa relação com os Estados Unidos, sem deixar que o país seja prejudicado pela sua crescente dependência de investimentos chineses. A entrada dos EUA no jogo, embora seja positiva, exige uma abordagem muito bem pensada, especialmente porque as negociações com a China estão longe de ser concluídas. O governo angolano precisa mostrar que tem uma visão clara e equilibrada, evitando um possível conflito de interesses e garantindo que os projectos de desenvolvimento com os EUA e a China sejam benéficos para os cidadãos angolanos”.
O entrevistado vai mais longe, e questiona se a visita será uma mera formalidade, ou haverá de facto uma vontade política de gerar avanços reais nas relações bilaterais? “Com Biden de saída da casa Branca, é possível que qualquer acordo feito durante essa visita seja mais uma manifestação pessoal de Biden, sem o compromisso formal do Estado norte-americano. Isso levanta o risco de que, se não houver uma continuidade política, os investimentos e acordos não tenham a sustentação necessária para se concretizarem plenamente”, considera o economista.
Oportunidades ou Estratégia Política?
“No entanto, a vinda de Biden a Angola também pode ser vista como uma oportunidade para atrair investidores, empresários e potencialmente mais receitas para o Estado angolano. O problema, como vimos com a China, está na execução e na efectividade desses investimentos. A presença de investidores não garante, automaticamente, que as benesses cheguem até a população, especialmente se as políticas não forem bem direccionadas”, respondeu ao POC Notícias, o economista, quando questionado sobre as oportunidades que podem surgir da visita do PR norte-americano.
Para o economista, a experiência com a China demonstrou que, apesar dos investimentos em infra-estrutura, os resultados direitos no bolso do cidadão angolano têm sido limitados. Agora, cabe ao governo angolano garantir que qualquer parceria com os EUA seja mais do que uma estratégia política para fortalecer a imagem do país no cenário internacional, sendo necessário que os acordos se traduzam em benefícios concretos para a economia, criando empregos e promovendo a diversificação industrial, sem que os recursos naturais do país sejam usados sem um retorno proporcional.
O economista Domingos Tchissasso, finaliza dizendo que “a relação com os Estados Unidos pode ser promissora, mas a sua concretização dependerá de uma negociação cuidadosa e de uma execução estratégica por parte do governo angolano. A verdadeira questão é se, após anos de proximidade com a China, Angola conseguirá equilibrar essas parcerias de forma que o país não saia mais uma vez como um perdedor nos jogos internacionais”.