António Correia, conhecido no meio cinematográfico angolano como “Fofartes”, é um realizador, produtor e editor de imagens para televisão e cinema. Começou a sua carreira em 2003, acumulando prémios e experiência ao longo dos anos. Com dois troféus conquistado no Brasil e responsável por três longas-metragens, quatro curtas e uma série, Fofartes compartilha, em entrevista exclusiva ao POC Notícias, as suas opiniões sobre a indústria do cinema em Angola e os desafios enfrentados pelos cineastas do país.
O que o inspirou a seguir a carreira de realizador e produtor de cinema em Angola?
Tudo começou aos 10 anos de idade, quando via o meu irmão mais velho fazer teatro (António Correia Lopes). Pedi a ele que me colocasse em seu grupo, o Zwelo Kidi, dirigido por ele e o Dawson. Mas foi em 2003 que comecei a enveredar pela área do cinema e televisão, movido pela paixão que criei ao assistir filmes nos vídeos clubes e na televisão nacional.
Quais foram os maiores desafios que enfrentou no início da sua carreira?
No início, não enfrentei muitas dificuldades, pois a minha família sempre apoiou o meu sonho. Sabia o que queria e onde desejava chegar. Fiz várias formações, participei em castings e procurei estar próximo dos melhores profissionais da época, o que me ajudou a firmar meu caminho no meio.”
Como avalia o crescimento da indústria cinematográfica em Angola?
Infelizmente, Angola ainda não tem uma verdadeira indústria cinematográfica. Para que isso aconteça, é necessário haver vontade política e incentivos por parte do Estado. Aqui, os produtores fazem os seus filmes com o que conseguem dos seus salários, ou com o apoio de amigos e parentes. O ideal seria que o Estado visse o cinema como uma forma de promover a imagem do país, além de contribuir para o PIB nacional e ajudar no combate ao desemprego e outros problemas sociais.
Seria extremamente benéfico se o Estado, no âmbito das políticas de promoção do turismo e da imagem do país, investisse na industrialização do cinema e no desenvolvimento do seu mercado. O cinema é uma das maiores vitrines de divulgação de um país, por meio de imagens, som e luz. Além disso, poderia contribuir significativamente para o PIB nacional, ajudando também a combater problemas sociais como desemprego, delinquência e prostituição.
Quais são os maiores desafios enfrentados pelos realizadores angolanos?
Os produtores e criativos em Angola enfrentam inúmeros desafios. Não existem políticas claras de divulgação das leis do audiovisual ou do cinema. Além disso, não há vontade política ou iniciativas de apoio, investimento ou patrocínio para projectos cinematográficos. Essa carência de investimentos acaba gerando outros problemas, como: dívidas, falta de material necessário e a redução das equipes de produção e técnicas. Acredito que, se as instituições do Estado que regulam o sector apostassem mais em nós e acreditassem no nosso potencial, assim como nós acreditamos, haveria menos erros e mais prosperidade.
O Estado precisa criar um Fundo Nacional de Investimento para Projectos Cinematográficos e, posteriormente, exigir a prestação de contas, cobrar os impostos e fazer com que o sector gere recursos, como acontece na Nigéria, no Congo e em outras indústrias cinematográficas sólidas.
O que pode ser feito para impulsionar o cinema angolano no cenário internacional?
Já estamos a ser impulsionados internacionalmente. Eu, por exemplo, ganhei dois troféus no Brasil. Filmes como Ar-condicionado e Minha Senhora da Loja do Chinês participaram de festivais internacionais de renome, e a atriz Cláudia Pucuta venceu o prémio de Melhor Atriz Africana. No entanto, o apoio de grandes empresas como TAAG, SONANGOL e UNITEL é fundamental. O cinema deve ser visto como um negócio e uma ferramenta de divulgação do país.
Quais temas ou histórias o atraem mais no cinema?
Gosto de explorar temas sociais e questões internas, geralmente no formato de drama. Tento retratar a vida quotidiana das pessoas e as suas lutas, algo que considero fascinante.”
Quais cineastas ou filmes influenciam seu trabalho?
O meu ídolo é Mel Gibson, pela forma como ele conta histórias no cinema. Também admiro os dramas de Will Smith e Denzel Washington. Em Angola, gosto muito do Mawete Paciência, Ngouabi Silva e Dorivaldo Cortês. Na minha geração, aprecio o trabalho de José Ambriz e Henrique da Costa Jr.
Quantos filmes já produziu e qual é o custo aproximado de produção de um filme?
Até agora, produzi três longas-metragens, quatro curtas e uma série. O investimento varia de acordo com o projecto, mas, em média, começa a partir de 15 milhões de kwanzas.
Quanto é pago aos actores em um filme?
Depende do orçamento do projecto e da negociação com o produtor executivo. O mercado angolano ainda não está estruturado o suficiente para termos uma tabela fixa de pagamento para os actores. Muitas vezes, um actor com 15 anos de experiência pode ganhar 10 vezes menos que um modelo ou músico famoso.”
Quais são seus próximos projectos? Existe algum tema ou gênero que ainda não explorou, mas gostaria?
Tenho vários projectos em andamento, tanto no cinema quanto no teatro, e acredito que irão surpreender os meus fãs. Quanto aos gêneros que já exploro, estou satisfeito. No entanto, estou sempre aberto a desafios.”
Qual é a sua visão sobre o uso de plataformas digitais para a exibição de filmes angolanos?
As plataformas digitais são uma mais-valia para compensar a fraca adesão do público às salas de cinema. No entanto, ainda temos muitos problemas relacionados à distribuição. O mercado é complexo, e as plataformas cobram tanto quanto os produtores. Precisamos de mais investimentos para criar um verdadeiro mercado de distribuição em Angola.
#FIM / POC Notícias