É curioso como certos personagens chegam até nós num momento em que, pessoalmente, também estamos a repensar as nossas escolhas. O Raul, de “Amor de Mãe”*, apareceu-me como um homem que, aos 50 anos, já tinha vencido no jogo da vida — pelo menos no que diz respeito a status, carreira e estabilidade. Mas o mais interessante é que, por dentro, ele estava em desequilíbrio. Era um homem a atravessar um momento de transição espiritual. E isso tocou-me.
O Raul é um sujeito que tem uma alma simples. É bom carácter, justo, sensível — apesar do ambiente frio em que se move. A sua relação com Lídia, interpretada brilhantemente pela Malu Galli, foi construída sobre um amor genuíno, mas também sobre um pacto social. O sobrenome dela teve um peso importante na ascensão dele. E isso, aos poucos, foi corroendo a autenticidade do casamento. Quando conheceu a Érica (Nanda Costa), uma mulher livre e de convicções claras, ele foi desarmado. Percebeu que o que tinha parecia muito… mas já não era suficiente.
Foi essa viragem que mais me interessou como actor. Porque acredito que há a vida que planeamos e a vida que acontece. E o Raul foi forçado a enfrentar a segunda. Lidar com o inesperado, com o julgamento alheio, com a culpa, com o amor fora do “script”. O maior conflito dele não era com a Lídia, nem com a Estela (Letícia Lima), mas com o próprio espelho. E, como artista, viver essa luta interior em cena é um presente raro.
* Novela em exibição no Globo ON todos os dias, às 21h00 (ANG).
A novela, criada e escrita por Manuela Dias, conta com a colaboração de Roberto Vitorino, Mariana Mesquita e Walter Daguerre, e supervisão de Ricardo Linhares. A direcção é de Walter Carvalho, Noa Bressane, Philippe Barcinski, Isabella Teixeira, Fellipe Barbosa e Kiko Marques.
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