ENTREVISTA
Em exclusivo ao POC NOTÍCIAS, o director do Instituto Angolano de Sistemas Eleitorais e Democracia e Coordenador do Observatório Eleitoral angolano, Luís Jimbo, fez uma abordagem complexa e coerente sobre o processo eleitoral, que começa com a convocatória feita pelo presidente da república, embora a constituição já define o que deve acontecer na terceira semana do mês de Agosto.
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POC NOTÍCIAS: Pedro José Mbinza | geral@pocnoticias.ao | Foto: DR
O que os partidos políticos devem fazer nesta fase e que avalição pode ser feita sobre a preparação dos mesmos?
São os partidos políticos, que, de acordo com o nosso quadro legal, são os únicos que podem apresentar as candidaturas. Infelizmente, ainda não temos um sistema que permite candidatura individual, no nosso sistema os partidos apresentam candidato para deputado e para presidente da república.
Ora, estes também devem, neste preciso momento, organizarem-se com a lista que vão apresentar como proposta e o programa de governação que também vão apresentar como proposta, e estas tarefas dos partidos políticos devem ocorrer de uma forma, obedecendo o princípio da democracia, porque, se o cidadão, o eleitor vai votar pelo princípio da democracia representativa, eleger os seus representantes para presidente da república e para deputados, também os partidos políticos têm a obrigação, pela força da constituição e da lei dos partidos políticos, organizarem-se de forma democrática. Isto tem a ver com a maneira como vão indicar os nomes que serão propostos nas listas, isto é, pelos órgãos próprios, por uma deliberação.
Que apreciação faz ao facto do tribunal constitucional ainda não ter feito a anotação dos congressos dos partidos políticos, inclusive do MPLA?
Nesta questão há desafio, porque, neste preciso momento, os partidos políticos MPLA, UNITA, PDP-ANA, Bloco Democrático e PADA realizaram congressos já no último trimestre de 2021, ou seja, realizaram congressos há menos de seis meses. E até ao preciso momento estes documentos discutidos nestes congressos, portanto, me refiro à forma de como quem vai conduzir o processo legítimo das listas das candidaturas internas, quem vai conduzir legitimamente e democraticamente a discussão dos programas de governação saídas destes congressos.
Para terem essa legitimidade, o tribunal constitucional tem que fazer anotação, porque é o último processo que dá legitimidade para então os órgãos eleitos tomarem decisões definitivas, mas o tribunal constitucional até ao preciso momento não fez nenhuma anotação, e estamos todos preocupados, naturalmente, os partidos políticos ainda mais.
Mas nós interessados a observar o processo, interessados a participar na transparência e na credibilidade do processo, estamos sim interessados que a anotação dos congressos dos partidos, realizados em 2021, sejam definitivas, ou seja, o tribunal constitucional tem a obrigação de tomar uma decisão célere e definitiva sobre este processo, porque coloca, como disse, todos os partidos políticos numa situação de incerteza sobre os seus actos a praticar e aqui são actos preparatórios ao processo eleitoral, muito importante.
O que vai acontecer?
Vamos entrar para fase eleitoral, como disse, fase que inicia com a convocatória das eleições pelo presidente da república e isto desencadeia automaticamente uma obrigação ao tribunal constitucional de aprovar as candidaturas nos próximos 20 dias, depois desta convocatória. Vamos ter o tribunal constitucional que hoje está nas vestes de poder para fazer anotação para dar legitimidade aos partidos políticos sobre os seus órgãos legítimos, mas depois vamos ter o próprio tribunal constitucional a aparecer como tribunal eleitoral, podendo dizer sim ou não, podendo rejeitar ou aceitar uma candidatura do próprio partido que o tribunal constitucional foi, objectivamente, a causadora, porque levou muito tempo para fazer anotação.
Foi a causadora para dizer ao partido político que a candidatura não passa, porque está fora do prazo ou porque não obedeceu requisito A, B e C e o partido reclamar-se de que as causas dessas insuficiências foi o tempo extremamente longo que o tribunal constitucional levou para fazer a anotação definitiva dos seus congressos. Isto sim vai provocar um ânimo político de suspensão, de tensão política entre o tribunal constitucional nas vestes de tribunal eleitoral.
E o caricato da democracia, querendo o partido reclamar, vai ter que novamente apresentar-se ao mesmo tribunal para reclamar de um vício que aponta para o próprio tribunal, ou seja, corremos o risco de ter um processo em que o tribunal constitucional seja o centro problemático e o centro da solução do processo eleitoral, porque o tribunal constitucional tem responsabilidades acrescidas sobre este processo.
Talvez seria o momento, já de advogar com essa experiência, de pensarmos em um tribunal especial, um tribunal eleitoral verdadeiramente neste período e não dar responsabilidade ao tribunal constitucional, que já tem as suas responsabilidades de decisões políticas e, depois, cujas essas decisões políticas interferem e têm consequências directas sobre os partidos políticos na organização do processo eleitoral, mas depois é o mesmo tribunal que é chamado para tomar uma decisão desta disputa, o que ao olho comum de qualquer cidadão fica a percepção de que o tribunal estaria em conflitos de interesse e não a promover a justiça, naturalmente.
“(…) corremos o risco de ter um processo em que o tribunal constitucional seja o centro problemático e o centro da solução do processo eleitoral, porque o tribunal constitucional tem responsabilidades acrescidas sobre este processo”
Como analisa a transparência eleitoral, colocando sobre a mesa a comissão nacional eleitoral e a contratação da INDRA?
Depois de Março, terminado o registo, a sociedade civil e o observatório eleitoral angolano vão puder apresentar um relatório e uma declaração sobre toda essa fase pré-eleitoral, por isso, agradeço essa entrevista que me solicitada. Já depois desta fase, vamos entrar nos actos propriamente eleitoral e aqui entra em cena a comissão nacional eleitoral e o tribunal constitucional: a comissão nacional eleitoral para organizar as assembleias de votos, os cadernos eleitorais, formar os membros que vão trabalhar nas mesas de votação, conduzir o programa de educação cívica eleitoral e o processo no centro de escrutínio nacional.
Está mais facilitado para a CNE, mas está um pouco mais complicado para a transparência e a verdade eleitoral. O desafio neste processo é como se vai transmitir esses dados do município, da mesa de voto para este centro de escrutínio nacional é aqui onde vem o debate já antecipado da contratação da INDRA e da MINSAT, que é uma empresa subsidiária da INDRA que anunciou que vai fornecer toda a solução tecnológica e toda logística.
Sobre esta questão, julgo que a CNE tem a obrigação e dever de ser mais transparente e mais aberta em explicar os termos destes contratos, precisamos saber a solução que está a ser colocada para o software do centro de escrutínio, precisamos saber neste pacote de contratação entre a CNE e a INDRA se vai ajudar os partidos políticos e a sociedade civil a fazer uma fiscalização e observação adequada.