POC NOTÍCIAS | OPINIÃO – HÉLDER GUIMARÃES | geral@pocnoticias.ao | Foto: DR
Luanda – O rapper Valete lançou há uma semana uma EP (Extended Play) intitulada “Aperitivos” com 8 faixas que têm se mostrado um excelente aperiente para o início do ano 2023.
Podemos definir informalmente que um aperitivo é algo que comemos antes da refeição, ou para abrir o apetite enquanto esperamos a refeição principal. Então podemos depreender desse título que há muito mais a caminho, pois estamos apenas ainda a consumir a entrada, aguardemos o prato principal.
A EP dividiu as opiniões no seio dos amantes de hip hop, nada fora do normal, uns elogiam a profundidade que dela advém, outros dizem não haver nada de especial.
Há ainda quem aproveita, com essa EP dar algumas alfinetadas e ressuscitar o suposto beef que existiu entre Viriz e o Prodígio, outros dizem não encontrar paralelo do Valete de hoje ao Valete dos álbuns Educação Visual (2002) ou Serviço Público (2006).
Embora ser normal existirem, essas comparações são absurdas. Mas é compreensível pois o Valete está há mais de 10 anos sem lançar um álbum e os fãs estão sempre expectantes e ansiosos aguardando por qualquer coisa nova do artista.
Mas vamos a EP, sendo um melómano e amante de hip hop como sou, eu diria que essa obra é um pequeno manancial do rap cantado em língua portuguesa.
As músicas trazem o que Valete já nos acostumou, mas mesmo escrevendo “melhor que o Saramago apaixonado” (como disse na faixa Intemporal) o Valete já não vai escrever uma música de amor igual, nem intemporal como o tema “A mulher que Deus amou”, mas não é porque o artista agora trabalha menos ou esteja menos inspirado que antes.
Mas sim porque já não voltaremos a viver aquele contexto. Nem nós, público, nem o artista, já não nos apaixonamos como naquela altura. No entanto a faixa Intemporal não deixa de ser um verdadeiro hino ao amor.
Ouvir Valete é como devorar um “Audiobook”, ele seria um storyteller relevante em qualquer gênero literário.
Nessa ÉP Keidje Lima (seu nome de registo) aproveita expurgar a dor da perda do seu pai. “Quando meu pai morreu (…) diziam que enlouqueci pela forma como agia / se eu não enlouquecesse, mano eu não aguentaria”.
É verdade, as vezes temos que enlouquecer para não perder a lucidez. Então “pai, como é que estás por aí?”
Todos temos uma S.I.G.L.A. uns são MTV outros mais TPA, assim como outros torcem pelo FCP, há quem sofre pelo SCP, mas temos todos que conhecer o ABC.
A EP fecha com um tema que homenageia os artistas da bola. Desde Alfredo Di Stéfano à Haaland, passando por Cruijff, Zidane, Pelê, Ronaldinho entre outros artífices que ‘voaram até serem de ouro’, tem que nascer mais de 1000 heróis para esquecermos Ronaldo e Messi.
Valete é um artista com um vocabulário muito rico, além disso é dos poucos mc’s a explorar modos e tempos verbais que os rappers raramente usam. Suas barras são carregadas de termos rebuscados, os seus duplos têm múltiplos sentidos e nessa EP o Viriz não deixou seus créditos em mãos alheias.